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Michael Haneke |
Se o cineasta sueco
Ingmar Bergman (1918-1997) conseguiu filosofar através do Cinema com filmes como ‘
O Sétimo Selo’ (
Det sjunde inseglet, 1956), ‘
Através de um Espelho’ (
Såsom i en spegel, 1961) e ‘
A Hora do Lobo’ (
Vargtimmen, 1968), levantando questões metafísicas humanas como a existência de deus, o livre arbítrio e o sentido da vida. O cineasta austríaco
Michael Haneke (1942-) conseguiu fazer uma análise psicológica usando o Cinema, revelando o lado obscuro da essência humana. No filme ‘
A Fita Branca’ (
Das weiße Band, 2009), com o qual ganhou a sua primeira Palma de Ouro no Festival de Cinema de Cannes, ele tenta compreender a gênese da doutrina nazista.
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A Fita Branca |
O enredo do filme se passa em uma pequena aldeia no interior da Alemanha às vésperas das 1ª Guerra Mundial (1914-1918). A paz e a calmaria são quebradas quando pequenos incidentes passam a ocorrer: um arame esticado entre duas árvores provoca um acidente com o médico local; um celeiro é incendiado; uma horta é destruída; o filho do barão é agredido, como também o filho da parteira, que possui necessidades especiais. A população da vila não sabe quem são os responsáveis pelos atos, o que cria uma desestabilização do ambiente, que é aumentada com a iminência da guerra, quando no dia 28 de julho de 1914 o arquiduque Francisco Ferdinand (1889-1914) é assassinado em Sarajevo.
O cineasta
Michael Haneke estudou Psicologia e Filosofia na Universidade de Viena, Áustria, antes de se dedicar ao Cinema. Nos seus filmes, há com frequência a tentativa de compreender as motivações psicológicas das personagens baseando-se nos princípios de Eros (o princípio de prazer) e a civilização (princípio de labuta e realidade), de modo que quanto mais se reprime os princípios de prazer, mais se exterioriza ações de autoflagelação, como, por exemplo, no filme ‘
A Professora de Piano’ (
La Pianiste, 2002), ou de agressão externa, como ocorre nos filmes ‘
O Vídeo de Benny’ (
Benny's Video, 1992), ‘
Violência Gratuita’ (
Funny Games, 1997) e ‘
Caché’ (2005).
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A Fita Branca |
Em ‘
A Fita Branca’, Haneke também trabalha o enredo na tentativa de compreender as motivações psicológicas das personagens. Todos os acontecimentos que deturpam o cotidiano da vila sugerem-se que são provocados por um grupo de crianças de idade entre cinco e quinze anos, filhos do pastor e outras famílias da localidade. Novamente, Haneke coloca a repressão de sentimentos e instintos como o elemento causador da exteriorização da violência, pois a educação das crianças é austera e rígida, seja no seu aspecto social quanto moral, já que a religião é algo presente e muito forte na vida delas.
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A Fita Branca |
Haneke, em ‘
A Fita Branca’, faz uma alegoria da gênese da ideologia nazista. As crianças que são retratadas no filme são aquelas que vinte anos depois serão os arautos e os agentes do nazismo, que estarão nas linhas de frente com a
Wehrmacht, bombardeando a Europa através da
Luftwaffe ou sendo agentes da SS (
Schutzstaffel). O que se tem, inicialmente, são crimes que quebram a hierarquia da comunidade, provocados contra o Médico e o Barão; depois crimes de intolerância, provocados contra o filho da parteira, que possui necessidades especiais; em seguida, há crimes de punição como disciplina contra as outras crianças. Todos crimes de ódio, causados pela repressão.
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A Fita Branca |
Um aspecto interessante é a fita branca, que no contexto da narrativa do filme significa a pureza. O Pastor da vila obriga seus filhos a usarem uma fita branca como um sinal de desconfiança, de modo que as crianças sejam lembradas a não cometerem desvios de condutas e não se entregarem as ações consideradas imorais, como a masturbação, por exemplo. Segundo o Pastor, o branco é a cor da inocência, da pureza e, assim, deve-se manter não só as crianças, mas toda a comunidade. Pode-se relacionar a fita branca, que é usada no braço das crianças, com o símbolo que os adeptos da ideologia nazista usarão no braço: a suástica.
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Eric Hobsbawm |
A história pode ser analisada a partir de um processo no qual forças materiais agem sobre a sociedade fazendo com os fatos ocorram. Pode-se fazer uma análise materialista da história, como feita por
Eric Hobsbawm (1917-2012) nos seus livros ‘A
Era dos Impérios-1875-1914’, que explica como um processo histórico de 39 anos culminou com a 1ª Guerra Mundial; ou mesmo ‘
A Era dos Extremos – 1914-1991’, no qual o historiador nos mostra como a 1ª Guerra Mundial (1914-1918) gerou a 2ª Guerra Mundial (1939-1945), propiciando a ascensão de regimes autoritários na Europa, seja na Espanha franquista, na Itália fascista ou mesmo na Alemanha nazista.
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Theodor W. Adorno |
Diferentemente de
Eric Hobsbawm, o que
Michael Haneke demonstra em ‘
A Fita Branca’ não são as raízes históricas do nazismo, mas, sim, as raízes mais profundas do mal, aquelas psicosociais, que são também trabalhadas pelo filósofo alemão
Theodor Adorno (1903-1969) ao tentar compreender a extrema racionalização esquemática e burocrática do regime nazista. Portanto, Haneke, em ‘
A Fita Branca’, tenta compreender a gênese da doutrina nazista justamente com aqueles que serão os seus arautos e agentes: crianças com idade entre cinco e quinze anos, tentando desvelar as características psicológicas das personagens, tendo a repressão das emoções e a expressão da violência como alicerce. Há a passagem do micro (vila) para o macro (sociedade alemã) com a tentativa de compreender um fato histórico a partir de uma perspectiva psicosocial.
Trailer do filme 'A Fita Branca'