A Volta das Coleções de Cinema em Fascículos

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No último dia 15 de fevereiro chegou às bancas o último fascículo da “Coleção Folha de Cine Europeu”. Ao todo, foram 25 edições de livros-DVD com produções de sete países do velho continente: oito produções italianas, sete francesas, quatro alemãs, duas espanholas, e uma russa, sueca, polonesa e inglesa, com filmes de diversas fases da história do Cinema mundial, passando pelo Expressionismo alemão, Realismo poético francês, Neo-realismo italiano, pela Nouvelle vague francesa e pelo Novo Cinema alemão (Junger Deutscher Film). Os destaques da coleção ficam por conta dos filmes “Asas do desejo”, de Wim Wenders; “A doce vida”, de Federico Fellini; “O Encouraçado Potemkin”, de Serguei Eisenstein; “Os Incompreendidos”, de François Truffaut e “Acossado”, de Jean-Luc Godard.

“Asas do desejo” (Der Himmel über Berlin, 1987) é um marco na carreira do cineasta alemão Wim Wenders (1945-), que havia ganhado a Palma de Ouro em Cannes com “Paris, Texas”, em 1984. A tradução do filme possui um aspecto grosseiro, pois leva em conta o péssimo remake hollywoodiano “Cidade dos anjos” (1998). Mas em “os céus sobre Berlim” há anjos que observam a humanidade em preto e branco. O filme aborda questões existenciais a partir da paixão do Anjo Damiel (Bruno Ganz) por uma trapezista chamada Marion (Solveig Dommartin), toda a tradição filosófica alemã, de Kant à Schopenhauer, passando por Heidegger, é colocada a partir de imagens que se tornam contemplativas, são elas poéticas, uma metáfora da condição ontológica humana.

Federico Fellini (1920-1993) é o cineasta mais expressivo do cinema italiano. Sua filmografia é uma das mais ricas da Sétima Arte. O nome do cineasta italiano é freqüentemente colocado nas listas de “melhores cineastas de todos os tempos”. Um dos seus filmes, que sempre é citado em listas de “os melhores filmes da história do cinema”, é “A Doce Vida” (La dolce vita, Itália, 1960). O filme é estruturado a partir de episódios encadeados como se fosse um mosaico. Pode-se dividi-lo em cinco partes, segundo cinco temas: o cinematográfico, o religioso, o intelectual, o familiar e o amoroso. O personagem central é o jornalista (colunista social) Marcello Rubini (Marcello Mastroianni), que tem acesso livre a todas as camadas e meios sociais da capital italiana.

O russo Serguei Eisenstein (1898-1948) foi um gênio. A sua teoria acerca da montagem cinematográfica, juntamente com a sua grande capacidade de dirigir grandes filmes como “A greve” (Statchka, 1924), “Outubro” (Oktiabr, 1927), “Alexandre Nevski” (Aleksandr Nevski, 1938) ajudaram a elevar o cinema à categoria de Sétima Arte. No filme “O Encouraçado Potemkin” (Bronenosets Potyomkin, 1925) podemos notar toda a genialidade de Eisenstein como cineasta. O filme tem uma estrutura coesa e uma montagem que revela a concepção formalista do grande cineasta russo, ele narra a história da revolta de um grupo de marinheiros no famoso Encouraçado, sendo ainda uma alegoria da revolta e da força da classe operária, que deve lutar contra a tirania e a opressão em prol de uma revolução do proletariado.

“Os Incompreendidos” (Les quatre cents coups, França, 1959) é um filme que trata da adolescência, um período de latência e descompasso entre o adolescente e o seu meio, seja escolar quanto familiar. O filme é, em grande parte, autobiográfico. A figura e a história de Antoine Doinel (Jean-Pierre Léaud) se confundem com as da infância do diretor François Truffaut (1932-1984), tanto que o ator Léaud é o alter ego de Truffaut, que realizou ainda mais um curta-metragem “Antoine e Colette” (L`amour à vingt ans, França, 1962) e três longas-metragens “Beijos proibidos” (Baisers volés, França, 1968), “Domicílio conjugal” (Domicile conjugal, França, 1970) e “Amor em fuga” (L'amour en fuite, França, 1978), todos tendo Antoine Doinel como protagonista. Nestes filmes, podemos acompanhar o desenvolvimento de Doinel até os trinta anos. Tais filmes mostram a influência de Balzac, já que os personagens aparecem em mais de um romance.

O filme de Jean-Luc Godard (1930-) “Acossado” (À bout de souffle, França, 1960) foi realizado em parceria com Truffaut, que escreveu o roteiro. A história do filme é simples: um homem, chamado Michel Poiccard (Jean-Paul Belmondo), rouba um carro em Marselha. Na fuga em direção à Paris, Michel mata um policial. Chegando na cidade luz, tenta encontrar um amigo que lhe deve algum dinheiro. Neste meio tempo, tenta convencer a jovem estudante estadunidense Patrícia (Jean Seberg) a irem juntos para a Itália. Em meio às divagações em um quarto, a jovem entrega Michel à polícia, que o mata em uma rua de Paris. O interessante que “Acossado” exige uma postura diferente do espectador, visto que a história é simples, no entanto, o modo como é estruturada a narrativa é extremamente complexa: não há uma progressão dramática; a narrativa é fragmentária, com diálogos aparentemente desconexos, mas cheios de elementos significantes.

A “Coleção Folha de Cine Europeu” retoma a tradição de fascículos semanais vendidos em bancas de jornais, que teve o seu ápice nas décadas de oitenta e noventa do século passado, com coleções das mais diversas áreas, tais como História, Literatura, Filosofia, Música, etc. O interessante da coleção é sua qualidade da curadoria e do projeto gráfico, com um conteúdo biográfico, filmográfico e crítico acerca dos cineastas e dos seus respectivos filmes a cargos de Cássio Starling Carlos e Pedro Maciel Guimarães, doutor em Cinema pela Sorbonne Nouvelle – Paris 3, responsável pela excelente qualidade dos textos.

Link do artigo que também foi publicado no jornal Tribuna Impressa:
http://www.araraquara.com/to-ligado/geral/2012/01/20/a-volta-das-colecoes-de-cinema-em-fasciculos.html

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