Viagens Imaginadas

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Viajar não é um fim, é um meio, um motivo, uma necessidade. O deslocamento no espaço gera uma nova relação com o tempo presente, essencial para se entender o passado, o futuro. Ter histórias, memórias. Viajo porque preciso; volto porque sinto saudades, porque tenho memórias de espaços, sensações, tempos, viajantes, amores. A viagem é metafísica, representante da dialética interior versus exterior, o roteiro contra o acaso, a percepção da dualidade da vida, dos sentimentos. A troca de seres, o contato. Caminhos criam roteiros lineares, podendo se cruzar, é a sinfonia do acaso. 

Contar relatos de viagens é algo arquetipal, várias culturas possuem seus mitos de criação e de viagens. Na cosmogonia, as aventuras dos heróis por terras estrangeiras são parte fundamental do desenvolvimento do indivíduo e da sociedade. O mito não é apenas uma leitura do mundo, mas também do homem.  Jasão viajou com os argonautas da Grécia até as terras do oriente em busca do velocino de ouro; Macunaíma percorreu terras dos “tristes trópicos” em busca de sua muiraquitã. Na tradição das narrativas nórdicas, os vikings possuem relatos de viagens de aventureiros como Ragnar Lodbrok que se lançaram aos mares com barcos chamados de “drakkars”. 

Heródoto narra em suas “Histórias”, sob o signo das musas, casos de aventureiros de diversos reinos da antiguidade que viajaram rumo a terras desconhecidas. Plutarco narrou “vidas ilustres” com destaque para a de Alexandre, o Grande; aventureiro e conquistador da Macedônia que conseguiu expandir o seu reino até os limites do extremo oriente, em territórios da Índia, estabelecendo o período helenístico da antiguidade. 

Marco Polo viajou de Veneza até o extremo oriente chegando às terras da Mongólia e China dominadas pelo Kublai Khan. Navegantes portugueses partiram do “Jardim das Hespérides” navegando em périplo pelo continente africano, passando pelo mar índico, atlântico, asiático até o Japão; culminando com a circunavegação da terra. 

No universo das histórias em quadrinhos, o personagem Corto Maltese, criado pelo italiano Hugo Pratt, é um aventureiro, um marinheiro com diversas histórias e “baladas em mares salgados” na Oceania, no continente americano, africano, asiático e europeu. Desaparece lutando nas “brigadas internacionais” durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), sua última aventura. 

O cinema possui os “road-movies”, um gênero específico para filmes que se baseiam em relatos de viagens. O cineasta italiano Federico Fellini realizou “A estrada da vida” sobre a história do casal circense de rua chamados de Gelsomina e Zampanò a partir de viés existencialista. Em “Exílios”, o diretor argelino Tony Gatlif coloca a questão da viagem como a busca pela identidade. No filme “Paris, Texas”, de Win Wenders, Travis é um caminhante, se perde por caminhos, retorna para estradas familiares. 

Relatar viagens é compartilhar experiências, sensações, impressões sobre culturas, lugares, tempos e aventuras; caminhando entre a subjetividade e a objetividade, entre a impressão e a escrita. Um devaneio da realidade.

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