The Ballad of John Lennon and Paul McCartney

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Contrariando o senso comum que diz ser verdade uma mentira contada mil vezes, em relação aos Beatles, essa afirmativa se mostra ainda mais complexa-, pois ela pode nascer como mentira e, depois, se tornar verdadeira, ou vice-versa. No caso de John Lennon e Paul McCartney o equivoco se mostra presente: John sempre foi considerado o revolucionário, enquanto Paul era o retrógado-, mas ambos trocaram de papel, ora um sendo revolucionário-, ora outro sendo retrógado.

Musicalmente falando, pode-se considerar Paul como o grande vanguardista dos Beatles-, responsável, inicialmente, pelo grande experientalismo musical, que caracterizou a banda a partir de 1964 com o lançamento dos discos A Hard Day’s Night e Help. Enquanto John vivia uma vida suburbana de classe média aos arredores de Londres-, Paul entrava em contato com a vanguarda artística londrina, o que acabou refletindo nas sua composições, basta pegarmos como exemplo a música Yesterday, que dialoga com a música de câmera, um tipo de produção clássica, composta por um quarteto de cordas que conta com dois violinos, uma viola e um violoncelo.

Neste primórdio, Paul incorporava, nas suas composições, os elementos musicais, artísticos e culturais da Swing London-, que estava em contato, transformando-se e posicionando-se de forma revolucionária frente à música Pop-, o que não ocorria com John, que ainda estava preso aquela visão da estrutura padrão do Rock ‘n’ roll, com os seus três ou quatro acordes com uma estrutura melódica e letras simples, como ele dizia: “Quero é fazer rock ‘n’ roll”, posicionando-se, assim, de forma retrógada e reacionária frente à música.

Depois, esta ordem e posicionamento artístico são modificados, John se mostra mais adepto ao experimentalismo musical, principalmente depois que conhece Yoko Ono, responsável por tirá-lo do ostracismo da sua vida provinciana e limitada. John passa a “competir” com Paul de forma mais incisiva, ampliando seus limites e sua visão a respeito da música. Neste momento que surge composições complexas como A Day in the life, I am the Walrus, Strawberry Fields Forever e Tomorow Never Knows.

A partir do projeto Get back, inciado em 1969, é que a visão duradoura e recorrente sobre as personalidades do Fab Four se consolidou, transformando John em revolucionário e Paul em retrógado, pois nas gravações dos discos Let it be ( gravado em 1969 e lançado em 1970) e Abbey Road (1969), pois enquanto o último se prendia em composições melódicas simples e recorrentes, como a música Let it be-, o primeiro trabalhava em músicas complexas e experimentalistas como I want you (she’s so heavy). Outro elemento que ajudou a consolidar esta visão, foi o fato de que, politicamente, John se tornou mais engajado com a esquerda, enquanto Paul se mostrava mais diplomático e conivente, e amigo, do establishment político e econômico.

Pode-se dizer que, nos primórdios dos Beatles, ao estabelecer o dialogo da música Pop com a música Clássica, Paul ampliou as possibilidade formais e alterou o padrão de composição do Rock ‘n’ roll, posicionando-se de forma revolucionária, enquanto John mostrava-se retrógado e reacionário, musicalmente. No entanto, depois de 1967-, esta ordem começa a se inverter, Paul ficando com uma imagem retrógada e reacionária-, e John passando a ser o revolucionário e experimentalista-, imagem que perdurada até os dias de hoje, reforçada pelo posicionamento político de John, cada vez mais de esquerda. Assim, uma mentira se transformou em verdade, mas nasceu mentira.

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