Na sua famosa composição niilista “God”, John Lennon (1940-1980) enumera vários nomes que ele não acredita. Dentre estes nomes está o de Robert Zimmerman (1941-). Indagado, em uma célebre entrevista para a famosa revista de rock Rolling Stone, em 1970, o porquê de ter dito não acreditar em Zimmerman ao invés de Bob Dylan, Lennon diz que não acredita em Dylan e que há apenas Zimmerman. No documentário “No Direction Home” (EUA, 2005), dirigido por Martin Scorsese (1942-), pode-se ver justamente a transformação de Robert Zimmerman em Bob Dylan: da sua infância em Hibbling-Minnesota, EUA, até a sua grande turnê européia, em 1966, no qual Dylan era Bob Dylan.

A estrutura do documentário é simples e seus aspectos formais são tradicionais dentro do gênero. Há o depoimento de Dylan, contando fatos de sua vida, acontecimentos de sua carreira, além de seus próprios comentários sobre todo o conteúdo da narrativa. Os depoimentos de Zimmerman se mesclam com entrevistas de pessoas que conviveram com o “menestrel”, como a cantora
Joan Baez, o poeta da geração Beat
Allen Ginsberg, e os músicos
Dave von Ronk,
Suze Rotolo,
Pete Seeger, dentre outros. Os depoimentos e as entrevistas do presente da narrativa se amalgamam com vídeos, fotos e entrevistas da época, além das performances de Dylan e sua banda entre 1960-1966.

A temática do documentário é divida em temas que tentam desvendar a “metamorfose” e os resquícios de Zimmerman em Dylan. A passagem, ou melhor dizendo, a fusão da música Folk com o Blues e o Rock. Cada tema é introduzido por uma performance de Dylan, o que sintetiza e introduz a temática do capítulo. O documentário mostra todos os dramas e as etapas da passagem de Zimmerman para Dylan, no plano musical, bem como as implicações e conseqüências desta mudança para a música Folk e para a música Pop, já que Dylan é o responsável por fundir o gênero musical Folk com o Rock, criando o Folk rock.

O cantor de músicas de protesto, que cantou na histórica marcha pelos direitos civis em Washington, capital dos EUA, onde
Martin Luther King fez o seu mais célebre discurso em 1963, é vaiado poucos anos depois por usar percussão e guitarra elétrica, sendo, então, chamado de traidor da música Folk no The Newport Folk Festival (Festival de Música Folk de Newport), em 1965. Dylan tocou suas canções com amplificadores e guitarras elétricas, tendo o excelente músico
Mike Bloomfield (1943-1981) como guitarrista, algo muito diferente de dois anos antes, quando se apresentou com Joan Baez apresentando as denominadas “músicas de protestos” com traços folks tradicionais tais como "
Blowin' in the Wind", "
A Hard Rain's a-Gonna Fall", "
Masters of War".

O documentário também mostra Dylan sendo chamado de traidor da “música de protesto’ na sua turnê inglesa, em 1966, quando no intervalo da música “
Ballad of a Thin Man” é chamado de “Judas”. Irritado Dylan retruca algumas palavras e começa a executar a música “
Like a Rolling Stone”, encerrando, assim, a apresentação. O show ocorreu no dia 17 de maio no Free Trade Hall, em Manchester e não, como foi propagado de forma equivocada, na casa de concertos londrina Royal Albert Hall.

Um dos pontos altos do documentário é o capítulo reservado à música “
Like a Rolling Stone”; todo o processo de composição, de gravação e de lançamento é mostrado. A música é um marco para a história da Música Serial do século XX, por ter ampliado as possibilidades formais da música Pop. A canção não estaria mais presa a uma forma fixa, pequena e limitada, seus limites formais de três minutos foram ampliados para mais de seis minutos. Ela foi lançada, inicialmente, em um EP (
single) no dia 20 de julho de 1965 e depois foi incluída no disco “
Highway 61 Revisited”, lançado mo dia 30 de agosto de 1965. Todas a músicas do discos tiveram um dos maiores produtores musicais de todos os tempos:
Tom Wilson (1931-1978).

”Por quantas estradas um homem deve caminhar para que o chamem de homem?” No documentário “
No Direction Home”,
Martin Scorsese caminha de 1941 até o ano de 1966, no qual o mundo passou a conhecer apenas e somente Bob Dylan. Ao final de 208 minutos de documentário, pode-se entender o que foi e o que é Bob Dylan. Há a possibilidade de se conhecer mais profundamente um gênio por trás de grandes composições como “
Blowin’ In The Wind”; “
A Hard Rain’s A- Gonna Fall”; “
Subterranean Homesick Blues”; “
Mr. Tambourine Man”, "
Desolation Row", “
Don't Think Twice, It's All Right” e, é claro, “
Like a Rolling Stone”, no qual há a certeza de que os gênios fazem as suas próprias regras. Mas, Zimmerman e Dylan ainda possuem traços em comum, o primeiro é Robert, o segundo é Bob, este diminutivo daquele, concordando com Lennon.
Trailer de No Direction home:
Trecho do show em que Bob Dylan é chamado de "Judas" no dia 17 de maio de 1966 no Free Trade Hall, em Manchester:
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