Uma música mereceria um filme? Algumas poucas dentro da história da música popular massiva da segunda metade do século XX, sim, tais como ‘Like A Rolling Stone’ (1965) do Bob Dylan, ou mesmo ‘A Day in The Life’ (1967) dos Beatles, ou ainda ‘Johnny B. Goode’ (1955) do Chuck Berry, como também ‘White Light/White Heat’ (1968) do Velvet Underground. A música ‘Sympathy For The Devil’ (1968), da banda inglesa The Rolling Stones, teve o seu processo de gravação em estúdio filmado pelo cineasta francês Jean-Luc Godard (1930-), sendo lançado com o título de ‘Sympathy For The Devil - One Plus One’ (Inglaterra, 1968) em um filme cheio de referências ao contexto musical, histórico, cultural e político de 1968.
![](//4.bp.blogspot.com/-Jk2zLgtBc3k/U-UcVrmjOoI/AAAAAAAADhM/gEL_4mG6aJQ/s1600/one-plus-one-poster.jpg)
Por gentileza, permita-me que apresente ‘‘
Sympathy For The Devil’, uma música de fortuna e requinte gravada em junho e lançada como abertura do lado A no disco ‘
Beggars Banquet’ em 06 de dezembro de 1968 pelos
Rolling Stones. A canção foi composta por
Mick Jagger tendo como inspiração para a letra o romance ‘
O Mestre e Margarida’ (1940) do escritor soviético
Mikhail Bulgakov e uma tradição ocultista que remete às ‘Litanias de Satã’ do poeta francês
Charles Baudelaire, ou ainda às ‘fáusticas histórias’ do escritor alemão
Goethe. Os arranjos são de
Keith Richards e
Brian Jones. O ritmo foi influenciado pela música modal africana a partir do Candomblé, que os músicos entraram em contato em uma visita à Bahia meses antes.
![](//1.bp.blogspot.com/-PlqYNIc1Xbw/U-UcXXi_Z0I/AAAAAAAADhU/bEfU7Rkc8RY/s1600/sympath01.jpg)
Prazer em lhe conhecer, quando o cineasta
Jean-Luc Godard vai a Londres, em junho de 1968, para realizar um filme com produtores britânicos, sua ideia inicial é modificada, sendo sugerido que faça uma produção com/sobre os
Beatles ou mesmo os
Rolling Stones. Os primeiros recusam por questões contratuais, já os segundos aceitam a proposta de realizar um filme com o grande nome da nouvelle vague francesa. Da parceria surge o filme ‘
Sympathy For The Devil - One Plus One’.
![](//4.bp.blogspot.com/-CND6a4hqqGg/U-UcZSCb03I/AAAAAAAADhc/0NrUH--lRHY/s1600/SympathyForTheDevil2.jpg)
O filme se inicia com o ensaio da música,
Brian Jones e
Mick Jagger estão com instrumentos de cordas decorando os primeiros versos da canção. Em seguida, chega
Keith Richards e, a partir de uma panorâmica horizontal, têm-se os outros músicos como o baterista
Charlie Watts e o baixista
Bill Wyman; Jagger entoa o refrão “
Pleased to meet you/Hope you guess my name”. A câmera é documental, mostra o processo de gravação no estúdio Olympic em Londres.
Godard entende a natureza do jogo, faz um filme que documenta o processo de gravação de ‘
Sympathy For The Devil” entre os dias 04 a 10 de junho de 1968, mas, não apenas. Poucos dias antes, o cineasta estava no Festival de Cinema de Cannes na França, sendo um dos arautos (juntamente com os cineastas
Carlos Saura, François Truffaut, Louis Malle, Terence Young e Roman Polanski) para o seu cancelamento em solidariedade às manifestações que estavam ocorrendo em Paris, em “Maio de 68”.
![](//4.bp.blogspot.com/-AU-aN7XZVAM/U-Uca6ko53I/AAAAAAAADhk/9dd3bYFRpWg/s1600/sympathymalcolm.jpg)
Mas, o que intriga é o filme de
Godard. O cineasta já havia abandonado as propostas estéticas da nouvelle vague para fazer filmes de caráter político através do grupo cinematográfico
Dziga Vertov, que fundara no início de 1968. No filme, o cineasta vai além da música, coloca a sua nova diretriz política marxista segundo várias esquetes narrativas, discutindo o contexto social e político da época, dando vozes para os Panteras Negras, com a discussão racial; para as formas de manifestações sociais e a posição do intelectual; ou ainda a Guerra do Vietnã. As esquetes são surrealistas, quebram com o efeito de realidade e com o discurso cinematográfico padrão.
![](//2.bp.blogspot.com/-Q1kw0ADW_QI/U-UdSZRVxBI/AAAAAAAADh0/JoibABq_Dm0/s1600/formidablemag-yardbirds-19.jpg)
Paris era o centro das manifestações políticas a partir de maio de 1968, Londres era a capital cultural. O termo “
Swinging London” foi usado para descrever a efervescência cultural da cidade que estava na vanguarda da música com a “invasão britânica’, das artes e do cinema com os diretores
Tony Richardson, Richard Lester e Lindsay Anderson. Assim, vários cineastas de outras nacionalidades foram filmar na cidade, tais como o francês
François Truffaut com ‘
Fahrenheit 451’ (1966), ou mesmo o italiano
Michelangelo Antonioni com o filme ‘
Blow-up’ (1967), e também
Jean-Luc Godard com ‘
Sympathy For The Devil - One Plus One’ (1968).
![](//3.bp.blogspot.com/-ZTH8zlQR3uo/U-UcU8A_RHI/AAAAAAAADhE/ckoIld8LDBA/s1600/one-plus-one-cinemarxism.jpg)
Com o filme ‘
Sympathy For The Devil - One Plus One’,
Godard cria uma polifonia, um conjunto de vozes, de discursos: do musical com o processo de gravação da canção ‘
Sympathy For The Devil’ centrado em uma banda de rock, os
Rolling Stones; como também político com os Panteras Negras; ou ainda histórico, com a discussão sobre a Guerra do Vietnã. As vozes são musicais, trechos de obras literárias, sociológicas ou mesmo filosóficas. Há a voz em off, que destoa da imagem, pichações em muros, carros com os dizeres: “Cinemarxism”, “Freudemocracy”, “sovietcongs”. Jean-Luc Godard cria uma obra que presenciará muitos acontecimentos.
Trailer do filme:
0 comentários:
Postar um comentário