O Cinema Indie com “Frank”

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Uma das perguntas mais difíceis que se pode colocar para alguém é quem ele é. Na maioria das vezes, a resposta surge a partir do verbo “ser” acompanhado da profissão: “sou médico”, “sou professor”, “sou físico”, etc. Assim, o ser é caracterizado pela profissão. No caso da personagem Frank, do filme homônimo inglês dirigido por Lenny Abrahamson, lançado em 2014, ele é músico, mas não um qualquer, faz parte de uma banda excêntrica e usa sempre uma cabeça gigante artificial. Sendo músico, é um artista que possui sensibilidade, loucura e criatividade, fazendo com que não se encaixe nos padrões sociais vigentes, com condutas diagnosticadas como loucas, insanas e anti-sociais.

O filme “Frank” não se incia com a personagem homônima principal, mas, sim, com Jon, um músico com um emprego fixo e burocrático em uma empresa. Ele tenta ter inspirações com coisas do cotidiano para compor músicas: uma criança construindo castelos de areia na praia, uma mulher com um bebê, uma moça com um casaco vermelho, outra com um azul, ou ainda o cartaz de uma banda que tocará na cidade, tudo pode se transforma em versos de uma canção. Em sua casa, tenta criar uma melodia com os versos, usando apenas três acordes. Utiliza um programa de computador e o seu teclado para compor, sem êxito. No twitter (@jonburroughs), escreve para quatorze seguidores: “trabalhando duro o dia todo em uma canção, agora, jantar”.

Jon tem a sua rotina quebrada quando presencia um homem tentando se afogar, na verdade o tecladista chamado Lucas da banda de Frank, conhecida como “The Soronprfbs”. A banda precisa de um novo tecladista, Jon se prontifica para assumir o posto. Ao chegar na apresentação, nota que a banda não é convencional, a começar pelos instrumentistas: Clara no Teremim, Nana na bateria, Baraque na guitarra e Frank nos vocais. A banda é inusitada não apenas pela cabeça gigante e artificial de seu vocalista e líder, mas também pelos músicos, que não tocam uma música tonal, em harmonia, em um único ritmo; mas, sim, uma música serial com cada instrumento em um tom. Jon é o novato, tenta improvisar, achar a nota certa.

O restante do filme é os músicos em uma casa à beira de um lago no interior da Irlanda. Querem compor um disco, o isolamento social e a união entre eles é a base, como ocorreu com os Rolling Stones, New Order e Happy Mondays. No entanto, Jon relata a rotina da banda no Twitter, saindo de quatorze para 25.790 seguidores, ou com vídeos no youtube. Os vídeos da excêntrica banda se tornam virais na rede. Recebem o convite para tocar no famoso festival de música Indie chamado SXSW na cidade de Austin, no Texas. Os músicos agem como deslocados, avessos ao sucesso, com exceção de Jon, que quer se tornar um músico famoso. No entanto, a banda é um catalizador social, um elemento agregador, não possui qualidades musicais para a indústria musical.

O filme “Frank” faz parte da linha de produções independentes (indie), conhecidas como “cinema indie”, com produções de baixo orçamento que trabalham a narrativa tendo personagens “deslocados” socialmente, caracterizados por patologia/esquisitices como acontece em filmes como “Pequena Miss sunshine” (EUA, 2006), dirigido pelo casal Jonathan Dayton e Valerie Faris; “O Futuro” (EUA, 2013) de Miranda July; ou ainda “Tudo Acontece em Nova York” (EUA, 2012) dos diretores Ruben Amar e Lola Bessis. São, na maioria das vezes, personagens problemáticos do ponto de vista social, que não se encaixam ou tem dificuldades de se enquadrarem em uma classe social ou mesmo de agir segundo o padrão social de comportamento ditado.

O interessante que este tipo de roteiro acaba fundindo dois gêneros difíceis de serem conciliados: a comédia e o drama. Pelo fato de possuir personagens deslocados socialmente, pode-se provocar situações inusitadas, devido à inaptidão nas relações sociais ordinárias, cotidianas, o que gera elementos de humor, como a situação de Frank que acaba tendo problemas por não conseguir fazer coisas banais como escovar os dentes. No riso, há o distanciamento, pois o espectador não se identifica com a personagem e, por isso, ri dela. Mas, logo em seguida, tem-se a causa do porque Frank usa a cabeça, criando também pontos dramáticos, o que cria uma empatia, ou seja, uma aproximação da personagem com o espectador, criando, deste modo, as bases do drama.

Na história da música pop há exemplos de músicos que não conseguiram lidar com a fama ou com determinados comportamentos sociais, como é o caso de Jim Morrison, Syd Barrett, Brian Wilson, Arnaldo Baptista, Ian Curtis e Kurt Cobain. Frank segue esta linha, sendo uma síntese de todos estes. No filme, o remédio de Frank é compor para ser a sua cura da sociedade doente. A música é a sua melhor amiga (como declama Jim Morrison) responsável pela união entre seus pares, iguais: loucos na sua balada. No fim, Jon percebe que não seria possível fazer os músicos da banda “The Soronprfbs” se adaptarem a uma sociedade doente, que o diga Syd Barrett: “Shine on, you crazy diamond/You were caught in the crossfire/Of childhood and stardom”.

Trailer do filme


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