The Beatles

0

The Magical Mystery Tour: um Filme dos Beatles

0

A banda inglesa The Beatles é a responsável por uma das grandes modificações da música serial pop da segunda metade do século XX: expandiram o gênero Rock’n’roll e configuraram, ao lado de Bob Dylan e The Velvet Underground, o gênero Rock, que iria se expandir em uma multiplicidade de gêneros tão dispares ao longo das décadas seguintes, em um movimento circular. No plano audiovisual, são os responsáveis por subverter o gênero cinematográfico musical e de criar a concepção inicial do videoclipe promocional. Ao todo, a banda possui cinco filmes: três pseudo-ficcionais, uma animação e um documentário. Mas, sem dúvida, o mais experimental de todos é “Magical Mystery Tour”, produzido, escrito e dirigido pelo quarteto de Liverpool.

The Magical Mystery Tour” é o terceiro filme do Fab Four, foi lançado no dia 26 de dezembro de 1967, sendo concebido como um especial de televisão com 50 minutos para ser exibido pela BBC londrina. Já haviam produzido “A Hard Day's Night” (traduzido no Brasil como “Os reis do iê iê iê”), em 1964, e “Help”, em 1965, ambos dirigidos pelo cineasta britânico Richard Lester. A estratégia inicial dos filmes era produzir trilhas sonoras que pudessem ser amplamente vendidas para um público fiel e, ao mesmo tempo, ampliá-lo, visto que ainda o Cinema era um importante meio de alcance e de comunicação de massas. Mas, os Beatles foram além, com filmes que subvertiam o discurso cinematográfico padrão.

O filme não possui uma narrativa comum, com uma história que tem início, meio e fim, pelo contrário, são cenas desconexas, carregadas por uma grande quantidade de “humor britânico”, influenciado principalmente por Peter Sellers e seu grupo Goons (precursor de grupos como Monty Python). O tour é feito em um ônibus pelos Beatles, freaks e uma trupe digna de “Os Palhaços”, de Fellini. Eles percorrem o interior da Inglaterra como se fossem um teatro de variedades itinerante em situações bizarras.

Há cinco sequências que servem de molde para a sua estrutura cinematográfica a partir de cinco músicas: a sequência inicial conta com a música “The Magical Mystery Tour”, no qual há os créditos iniciais e apresentação dos personagens do tour. The Fool On The Hill” funciona como um tema para a exposição de uma narrativa idílica de Paul McCartney; na passagem para a música “Flying” há o sonho do restaurante onde John Lennon serve macarrão com uma pá para a tia de Ringo, chamada Jesse. Em “I am The Walrus” tem-se uma sequência cheia de intertextualidades, assim como a letra da música, com o livro “Alice no país das maravilhas”, de Lewis Carroll, e, por fim, “Your Mother Should Know” com uma sequência similar aos shows de auditorios britânicos com todos os participantes subindo ao palco e dançando no ato final.

O interessante é que o filme se apropriara de trechos eliminados da versão final de “Dr. Strangelove” (EUA, 1964), de Stanley Kubrick. Outro aspecto é que os Beatles dispensaram roteiro, narrativa convencional ou mesmo toda idéia clara de direção, as cenas foram filmadas a partir de improvisações; fizeram ainda uma colagem de canções fundindo teatro de variedades com Rock. Sem dúvida, o filme é um marco da cultura Pop mundial. O projeto e a composição da música título ficaram a cargo de Paul McCarteny e cada Beatles ficou com um trecho do filme para desenvolver uma sketch.

No dia 1º de junho, deste mesmo ano, os Beatles lançaram o álbum mais cultuado da música serial pop, o espetacular Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band. O primeiro álbum conceitual da história do rock, que o elevou ao status de Arte. “The Magical Mystery Tour” insere-se neste contexto, no ápice a criatividade do Fab Four, entre os álbuns Sgt. Pepper e o White Álbum (1968). Além do filme, ainda lançaram o disco homônimo em forma de EP (extended play) duplo com as músicas “Magical Mystery Tour”, “Your Mother Should Know”, “I Am the Walrus”, “The Fool on the Hill”, “Flying”, “Blue Jay Way”. Mas, o filme merece um lugar de destaque dentro do gênero, pois foi revolucionário: Roll up/And that's an invitation./Roll up for the Mystery Tour.


O Cinema da Nouvelle Vague Francesa

0

François Truffaut (1932-1984) é, ao lado de Jean-Luc Godard (1930-), o cineasta mais expressivo da Nouvelle Vague Francesa. O seu filme “Os Incompreendidos” (Les 400 Coups, França) é considerado o marco da estética cinematográfica francesa mais importante da segunda metade do século XX. O filme foi lançado no Festival de Cannes de 1959, tendo recebido o prêmio máximo: a Palma de Ouro. Este prêmio representou o estabelecimento da Nouvelle Vague como uma corrente estética, abrindo as portas para uma grande quantidade de jovens cineastas e também críticos ligados à famosa revista de crítica cinematográfica Cahiers du Cinema (Cadernos de Cinema), tais como Alain Resnais (1922-), Eric Rohmer (1920-2010) e Claude Chabrol (1930-2010).

Para efeito de marco cronológico, a Nouvelle Vague Francesa surge em 1959, no Festival de Cannes com a premiação da Palma de Ouro para o filme “Os Incompreendidos”, de François Truffaut. Mas é em 1960 que ela se consolida e se configura com uma estética cinematográfica revolucionária com a realização do filme “Acossado” (À bout de souffle), de Jean-Luc Godard. A própria trajetória de Godard e Truffaut resume o que foi a estética cinematográfica da Nouvelle Vague Francesa. A “nova onda” surgiu a partir de jovens cineastas franceses que tinham uma formação cinéfila e crítica adquiridas na Cinemateca francesa e nas páginas da Cahiers du Cinéma. Eles passaram de uma atividade crítica para uma prática cinematográfica a partir de uma nova forma de produzir filmes e de conceber a linguagem cinematográfica.

No que tange a formação cinéfila e a critica dos cineastas da Nouvelle Vague, a cinemateca francesa fundada por Henri Langlois (1914-1977), em 1936, e a revista de crítica cinematográfica Cahiers du Cinéma fundada por André Bazin (1918-1958), em 1951, são de extrema importância. Na cinemateca, os jovens cineastas puderam ter contato com os filmes mais representativos e com os cineastas mais importantes da história do cinema. Nela, tiveram e consolidaram toda a sua formação cinéfila. A cinemateca francesa foi ainda um dos pivôs que desencadearam as manifestações de Maio de 68, pois o seu fundador e curador Henri Langlois havia sido demitido, o que originou manifestações públicas e de rua por parte dos freqüentadores e dos cineastas da Nouvelle Vague, que cancelaram o festival de Cannes de 68 em apoio às manifestações nas ruas do bairro Quartier Latin, em Paris.

A revista Cahiers du Cinéma foi o veículo de formação crítica dos cineastas. Ela foi fundada pelo crítico e estudioso André Bazin (1918-1958), que é considerado o “pai” da crítica cinematográfica. Ele desenvolveu um conjunto de conceitos e uma linguagem que caracterizava e formatava a então crítica nascente. Bazin é considerado o mentor teórico da Nouvelle Vague, todos os cineastas mais representativos, de François Truffaut a Jean-Luc Godard, passando por Eric Rohmer foram seus discípulos e colaboradores na revista, com artigos, resenhas e estudos críticos. A revista foi o embrião dos conceitos e das idéias colocadas em prática nos filmes. Bazin morreu no primeiro dia de filmagem de “Os Incompreendidos”, o filme é dedicado a ele.

Os cineastas da Nouvelle Vague acreditavam em uma linha evolutiva do Cinema e tinham total consciência dos elementos da linguagem cinematográfica. Salientavam que seus precursores eram cineastas como Jean Renoir (1894-1979), Orson Welles (1915-1985), Agnés Varda (1928), Roberto Rossellini (1906-1977), Alfred Hitchcook (1899-1980), Fritz Lang (1890-1976), todos estes cineastas possuíam e desenvolveram um estilo próprio, que os caracterizavam e os diferenciavam dos demais, através de uma maneira própria de utilizar o discurso cinematográfico. Estudando estes cineastas, François Truffaut publicou, em 1954, um importante artigo sobre a “política dos autores” (La politique des auteurs). A tese central do artigo afirmava que, mesmo sendo uma Arte coletiva, a obra cinematográfica poderia possuir um autor, assim como a figura do escritor na obra literária. O autor da obra cinematográfica seria o diretor, pois ele que seleciona e condiciona todos os elementos da linguagem cinematográfica.

Muito tem-se discutido se a Nouvelle Vague é uma estética cinematográfica ou não. Uma estética surge no momento em que ela ganha significação social a partir de um conjunto de normas e conceitos sobre a relação da Arte cinematográfica com a sociedade em um contexto histórico definido. Neste caso, a Nouvelle Vague seria sim uma estética cinematográfica. Pois, ela surge em um contexto histórico definido, tendo um conjunto de adeptos com a mesma formação cinéfila e crítica. A discussão do ser ou não ser surge porque há uma dissonância de estilo, não de qualidade, entre os cineastas da Nouvelle Vague, de modo que os filmes de Truffaut em nada se parecem com os de Godard, que destoam dos de Alain Resnais e de Eric Rohmer. Os únicos pontos em comum entre estes cineastas são a formação cinéfila e crítica, além dos elementos de negação do modelo de produção de filmes vigente até o final da década de 50, como também uma nova postura frente à Arte cinematográfica, feita de forma autoral.

A Nouvelle Vague Francesa representou uma nova forma revolucionária de fazer e de conceber o Cinema, seja nos aspectos formais quanto conteudísticos. Seus adeptos eram todos cinéfilos e críticos, cineastas com um excelente conhecimento da história do Cinema, bem como dos elementos de sua linguagem. Conheciam o ponto de ostracismo e inércia em que se encontrava o Cinema representado pela indústria cinematográfica hollywoodiana e, principalmente, o Cinema francês da década de 50, cheio de clichês e grandes produções. Como cinéfilos, queriam o desenvolvimento da linguagem cinematográfica, como críticos, vislumbravam uma nova forma de produzir filmes, mais simples e autoral.


Para ver: Metrópolis (Fritz Lang, Alemanha, 1927)
Para ler: Hitchcock/Truffaut Entrevistas (Editora brasiliense, 1987)

Publicado: http://www.araraquara.com/to-ligado/geral/2012/02/03/o-cinema-da-nouvelle-vague-francesa.html

Cartazes na Parede

0

The Flaming Lips

0



A Volta das Coleções de Cinema em Fascículos

0

No último dia 15 de fevereiro chegou às bancas o último fascículo da “Coleção Folha de Cine Europeu”. Ao todo, foram 25 edições de livros-DVD com produções de sete países do velho continente: oito produções italianas, sete francesas, quatro alemãs, duas espanholas, e uma russa, sueca, polonesa e inglesa, com filmes de diversas fases da história do Cinema mundial, passando pelo Expressionismo alemão, Realismo poético francês, Neo-realismo italiano, pela Nouvelle vague francesa e pelo Novo Cinema alemão (Junger Deutscher Film). Os destaques da coleção ficam por conta dos filmes “Asas do desejo”, de Wim Wenders; “A doce vida”, de Federico Fellini; “O Encouraçado Potemkin”, de Serguei Eisenstein; “Os Incompreendidos”, de François Truffaut e “Acossado”, de Jean-Luc Godard.

“Asas do desejo” (Der Himmel über Berlin, 1987) é um marco na carreira do cineasta alemão Wim Wenders (1945-), que havia ganhado a Palma de Ouro em Cannes com “Paris, Texas”, em 1984. A tradução do filme possui um aspecto grosseiro, pois leva em conta o péssimo remake hollywoodiano “Cidade dos anjos” (1998). Mas em “os céus sobre Berlim” há anjos que observam a humanidade em preto e branco. O filme aborda questões existenciais a partir da paixão do Anjo Damiel (Bruno Ganz) por uma trapezista chamada Marion (Solveig Dommartin), toda a tradição filosófica alemã, de Kant à Schopenhauer, passando por Heidegger, é colocada a partir de imagens que se tornam contemplativas, são elas poéticas, uma metáfora da condição ontológica humana.

Federico Fellini (1920-1993) é o cineasta mais expressivo do cinema italiano. Sua filmografia é uma das mais ricas da Sétima Arte. O nome do cineasta italiano é freqüentemente colocado nas listas de “melhores cineastas de todos os tempos”. Um dos seus filmes, que sempre é citado em listas de “os melhores filmes da história do cinema”, é “A Doce Vida” (La dolce vita, Itália, 1960). O filme é estruturado a partir de episódios encadeados como se fosse um mosaico. Pode-se dividi-lo em cinco partes, segundo cinco temas: o cinematográfico, o religioso, o intelectual, o familiar e o amoroso. O personagem central é o jornalista (colunista social) Marcello Rubini (Marcello Mastroianni), que tem acesso livre a todas as camadas e meios sociais da capital italiana.

O russo Serguei Eisenstein (1898-1948) foi um gênio. A sua teoria acerca da montagem cinematográfica, juntamente com a sua grande capacidade de dirigir grandes filmes como “A greve” (Statchka, 1924), “Outubro” (Oktiabr, 1927), “Alexandre Nevski” (Aleksandr Nevski, 1938) ajudaram a elevar o cinema à categoria de Sétima Arte. No filme “O Encouraçado Potemkin” (Bronenosets Potyomkin, 1925) podemos notar toda a genialidade de Eisenstein como cineasta. O filme tem uma estrutura coesa e uma montagem que revela a concepção formalista do grande cineasta russo, ele narra a história da revolta de um grupo de marinheiros no famoso Encouraçado, sendo ainda uma alegoria da revolta e da força da classe operária, que deve lutar contra a tirania e a opressão em prol de uma revolução do proletariado.

“Os Incompreendidos” (Les quatre cents coups, França, 1959) é um filme que trata da adolescência, um período de latência e descompasso entre o adolescente e o seu meio, seja escolar quanto familiar. O filme é, em grande parte, autobiográfico. A figura e a história de Antoine Doinel (Jean-Pierre Léaud) se confundem com as da infância do diretor François Truffaut (1932-1984), tanto que o ator Léaud é o alter ego de Truffaut, que realizou ainda mais um curta-metragem “Antoine e Colette” (L`amour à vingt ans, França, 1962) e três longas-metragens “Beijos proibidos” (Baisers volés, França, 1968), “Domicílio conjugal” (Domicile conjugal, França, 1970) e “Amor em fuga” (L'amour en fuite, França, 1978), todos tendo Antoine Doinel como protagonista. Nestes filmes, podemos acompanhar o desenvolvimento de Doinel até os trinta anos. Tais filmes mostram a influência de Balzac, já que os personagens aparecem em mais de um romance.

O filme de Jean-Luc Godard (1930-) “Acossado” (À bout de souffle, França, 1960) foi realizado em parceria com Truffaut, que escreveu o roteiro. A história do filme é simples: um homem, chamado Michel Poiccard (Jean-Paul Belmondo), rouba um carro em Marselha. Na fuga em direção à Paris, Michel mata um policial. Chegando na cidade luz, tenta encontrar um amigo que lhe deve algum dinheiro. Neste meio tempo, tenta convencer a jovem estudante estadunidense Patrícia (Jean Seberg) a irem juntos para a Itália. Em meio às divagações em um quarto, a jovem entrega Michel à polícia, que o mata em uma rua de Paris. O interessante que “Acossado” exige uma postura diferente do espectador, visto que a história é simples, no entanto, o modo como é estruturada a narrativa é extremamente complexa: não há uma progressão dramática; a narrativa é fragmentária, com diálogos aparentemente desconexos, mas cheios de elementos significantes.

A “Coleção Folha de Cine Europeu” retoma a tradição de fascículos semanais vendidos em bancas de jornais, que teve o seu ápice nas décadas de oitenta e noventa do século passado, com coleções das mais diversas áreas, tais como História, Literatura, Filosofia, Música, etc. O interessante da coleção é sua qualidade da curadoria e do projeto gráfico, com um conteúdo biográfico, filmográfico e crítico acerca dos cineastas e dos seus respectivos filmes a cargos de Cássio Starling Carlos e Pedro Maciel Guimarães, doutor em Cinema pela Sorbonne Nouvelle – Paris 3, responsável pela excelente qualidade dos textos.

Link do artigo que também foi publicado no jornal Tribuna Impressa:
http://www.araraquara.com/to-ligado/geral/2012/01/20/a-volta-das-colecoes-de-cinema-em-fasciculos.html