Apocalipse Agora, no Cinema

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Se você está lendo este texto na manhã do dia 21 de dezembro de 2012, o mundo não acabou. Mas, se acabar, a trilha sonora perfeita seria a música “The End”, da banda estadunidense The Doors, com o seu verso inicial: “This is the end” (“Este é o fim”). O tema do fim do mundo é algo fascinante: na nossa tradição de matriz judaico-cristã há o gênese e o apocalipse; no entanto, temos mais predileção pelo último, já que a criação, para a consciência humana, é algo a priori enquanto a destruição é a posteriori. A fascinação pelo apocalipse também alimenta diversas narrativas cinematográficas com as suas histórias de como será o fim da humanidade e do planeta Terra. Nos últimos trinta anos, diversos filmes trabalharam diretamente o tema, seja a partir do apocalipse nuclear, nas décadas de 1970 e 80; ou o apocalipse cósmico, na década de 1990; como também o apocalipse zumbi propagado nos últimos anos.

Of our elaborate plans, the end”. Durante a Guerra Fria (1945-1991), o mundo, polarizado pelos Estados Unidos de um lado e a União Soviética de outro, sofre com uma corrida armamentista de proporções nucleares, onde cada um dos dois países teria armas nucleares suficientes para destruir centenas de vezes o planeta. A cada novo conflito indireto, que houvesse a perspectiva de um conflito direto, os ponteiros do “relógio do apocalipse” chegava mais perto da meia-noite, do fim do mundo, com o consequente apocalipse nuclear. Filmes como “O dia seguinte” (The day after, EUA, 1983), dirigido por Nicholas Meyer; “Herança nuclear’ (Testament, EUA, 1983), de Lynne Littman; e o excelente “O Último Brilho do Crepúsculo” (Twilight’s Last Gleaming, EUA-Alemanha Ocidental, 1977), dirigido pelo experiente diretor Robert Aldrich; são exemplos de produções deste período histórico no qual havia a iminência de um fim nuclear para todos os planos da humanidade. 

No safety or surprise, the end”. Com o fim da União Soviética, em 1991, e com a “despolarização política”, a predominância do apocalipse nuclear cedeu espaço para o apocalipse cósmico, no qual o fim do planeta e dos seres humanos se daria a partir de eventos e causas que são exteriores a Terra e independem da ação humana. Filmes que meteoros, asteroides estão em rota de colisão com o planeta se propagaram durante a década de 1990, com produções tais como “Impacto Profundo” (Deep Impact, EUA, 1998); “Armagedom” (Armageddon, EUA, 1998); “Asteroide” (Asteroid, EUA, 1997). O interessante é que em narrativas fílmicas apocalípticas nas quais a destruição da Terra é causada por fatores externos ao planeta são substituídas, a partir do ano 2.000, por outras narrativas onde a destruição é causada por fatores internos, como desastres naturais e ambientais, em filmes como “O Fim do Mundo” (Category 7: The End of the World, EUA, 2005); “O Dia Depois de Amanhã” (The Day After Tomorrow, EUA, 2004); “2012” (EUA, 2009). 

Of everything that stands, the end”. Sem dúvida, o tema mais interessante para o apocalipse é o zumbi. No apocalipse zumbi a humanidade é reduzida a poucos sobreviventes de uma infestação que reduziu o resto da humanidade a zumbis. No cinema, a tradição começou na década de 1960 com o filme “A Noite dos Mortos-Vivos” (Night of the Living Dead, EUA, 1968), dirigido por George Romero. Nos últimos anos, filmes que tratam do apocalipse zumbi se proliferaram, tais como “Dead Meat: O Banquete dos Zombis” (Dead Meat, Irlanda, 2004); “Apocalipse Zumbi” (Zombie Apocalypse, EUA, 2011); “[REC]³ Gênesis” (Espanha, 2012); “The Zombie Diaries” (U.K, 2006); “Planeta Terror” (Grind House: Planet Terror, EUA, 2007) e todos os filmes da franquia “Resident evil”. O que se nota nos filmes deste gênero é a mudança de caráter independente da produção para superproduções, já que o tema é altamente vendável e se desdobra em diversos outros produtos, o que a indústria do cinema adora. 

The end of laughter and soft lies”. Todavia, os melhores filmes sobre o apocalipse não tratam do fato de forma direta e objetiva, mas sim de forma indireta e subjetiva, como é o caso do excelente filme “Melancolia” (Melancholia, Dinamarca, 2011), escrito e dirigido por Lars von Trier, o mesmo de “Os Idiotas” (1998), “Dançando no escuro” (2.000), “Dogville” (2003) e “O Anticristo” (2009). Em “Melancolia’, o planeta, chamado Melancolia, está em rota de colisão com a Terra; a personagem Justine, interpretada por Kirsten Dunst que ainda recebeu o prêmio de melhor atriz do Festival de Cannes; se transforma em uma pessoa triste e melancólica rente ao apocalipse iminente. Não há salvação, nem mesmo um lugar onde se apoiar, há “o fim da gargalhada e das mentiras suaves”. 

The end of nights we tried to die”. Viver não é o bastante, morrer é preciso. Mas, o ser humano não consegue aceitar o fim, a morte, como algo simples e natural. Há a necessidade de um fim grandioso, seja tentando sobreviver a uma guerra nuclear, a desastres naturais, impactos de asteroides e cometas ou a uma horda de zumbis, como visto em dezenas de filmes. No entanto, se o mundo fosse realmente acabar e a humanidade tiver conhecimento dos fatos, não gostaria que fosse a partir de um apocalipse zumbi, pois quem me garantiria que não seria um infectado, mas sim através da destruição cósmica ou mesmo pelo planeta Melancolia. Há o alfa e o ômega, quem tiver olhos, veja; quem tiver ouvidos, ouça: “This is the end”.

O Videoclipe Dentro do Audiovisual

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Os gêneros, dentro de uma dada linguagem, podem ser considerados como particularidades que os identificam e os singularizam em relação a outros gêneros. Se pegarmos a área do audiovisual, o videoclipe seria um gênero que se desprende do Cinema e se configura com características próprias a partir de dois elementos sintáticos bases: a performance e a narratividade. Há três principais estágios do desenvolvimento do videoclipe: o primeiro, a sua gênese na década de 1960 com os Beatles; o segundo, na década de 1980 com o surgimento da MTV; e o terceiro, a partir do ano de 2005 com o surgimento do site youtube. 

No seu início, o videoclipe se desprende dos musicais hollywoodianos, que serviram como modelo para bandas e cantores de rock para venderem não só a música, mas também a imagem do artista. Um dos pioneiros neste segmento foi Elvis Presley (1935-1977), que atuou em mais de vinte produções. A função da música era apenas a de suspender a ação e fazer um comentário sobre a narrativa. Assim, quando a ação era suspensa começa a performance do artista. Os musicais se mostraram de estrema valia para a então nascente indústria musical, por ser um meio de fácil assimilação junto ao público e também por ser um excelente canal de divulgação.  

Na década de 1960, há uma quebra importante com a estrutura e um novo recurso, que surgiria dentro de um musical, mas que será um dos elementos que caracterizarão o videoclipe. No filme “A Hard Day's Night” (Inglaterra, 1964), do diretor Richard Lester, os Beatles dão o primeiro passo para aquilo que será conhecido depois como vídeos promocionais de divulgação. Na cena da música “I should have known better”, os Beatles, após correrem pelo trem, acabam se trancando dentro de um compartimento de cargas, enquanto há fãs que os observam, começam a cantar a música. O elemento inovador consiste no fato da cena não haver nenhum instrumento musical, que aparecem de repente (guitarra, baixo, bateria e gaita) e depois somem, o que quebra com o naturalismo da narrativa, juntamente com a passagem da música extradiegética para diegética, ou seja, a passagem do som que está fora do universo da ação para um dentro do universo da ação. 

Os Beatles seriam responsáveis ainda por dar o objetivo que caracteriza o videoclipe: o promocional. Não podendo comparecer ao diversos compromissos e não querendo mais fazer shows ao vivo, resolveram gravar vídeos, na época chamados de “vídeos-promocionais”, e os enviaram às emissoras de televisão. Os primeiros vídeos gravados foram “Paperback Writer” e “Rain”, em 1966, que foram exibidos no programa do apresentador estadunidense Ed Sullivan, no canal CBS. A banda ainda produziu diversos outros vídeos, merecendo especial destaque “Strawberry Fields Forever” e “Panny Lane”. 

Na década de 1980, surge o segundo e mais importante estágio da história do videoclipe, inaugurado pela criação do canal MTV (Music TeleVision), em 1981. Durante mais de 20 anos, a emissora foi a referência e a controladora do gênero, assimilando a sua imagem ao videoclipe. Os videoclipes eram elementos fundamentais para a promoção mercadológica de determinadas bandas, que deveriam produzir vídeos de divulgação que eram exibidos na grade da emissora. Neste segmento, tem-se o auge dos artistas pop da década de 1980 e 1990, que assimilaram a importância do videoclipe para a vendagem de discos, como Michael Jackson, Madonna, Dire Straits, e até mesmo a banda Nirvana, com o seu “Smells Like Teen Spirit”. 

O terceiro estágio surge a partir dos anos 2.000 com a popularização das câmeras filmadoras e barateamento da produção audiovisual, o que propiciou e popularizou o formato do videoclipe, pois qualquer artista ou banda poderia produzir os seus vídeos promocionais e colocá-los no youtube, o que criou uma cena independente de produção e distribuição. No entanto, até mesmo os “grandes” artistas pop assimilaram a importância do canal, de modo que passaram a criar contas para colocarem os seus vídeos na internet. Todavia, o maior resultado de promoção dos vídeos e, consequentemente, dos cantores e bandas pop veio da parodia dos videoclipes, que criavam uma gama enorme de reproduções das coreografias e das performances, das mais bizarras e grotescas possíveis. 

O videoclipe, enquanto gênero audiovisual autônomo, surge apenas na década de 80 do século passado. Em sua gênese, ele se desprende dos filmes musicais hollywoodianos, a partir dos vídeos promocionais dos Beatles, na década de 1960, e desenvolve características próprias, como narratividade e performance, de forma sintética. Estes dois elementos apresentam-se como estruturas recorrentes na maioria das obras do gênero: há a performance, com os músicos da banda simulando executarem a canção e há, na maioria dos casos, uma micronarrativa, desta maneira a organização sintática origina-se na alternância destes dois elementos. No entanto, o youtube e a popularização das câmeras de filmagem ampliaram o gênero e tornaram mais fácil a produção e a divulgação. A questão da parodia dos videoclipes é um artigo a parte.