Fotografia com Cinema com Sebastião Salgado

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No início era a luz, a Fotografia retendo uma cena que era efêmera para as retinas humanas tão fatigadas pelo olhar automatizado do cotidiano. Depois, o Cinema com os seus vinte e quatro fotogramas por minuto, criando a ilusão de movimento. A Fotografia e o Cinema são expressões artísticas que guardam semelhanças: em ambas a luz é um dos elementos mais importantes. No documentário “O Sal da Terra” (Brasil/França, 2015), a vida e a obra do fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado (1944-) são mostradas a partir de depoimentos e fotografias que se mesclam com imagens de expedições nos quatro cantos do Planeta Terra captadas ao longo de alguns anos pelo seu filho Juliano Ribeiro Salgado, que assina a direção juntamente com o cineasta alemão Wim Wenders (1945-). 

Daguerreotipo de 1838
O nascimento (e a história da Fotografia) é marcado pelo duplo movimento de desenvolvimento de tecnologias e mecanismos capazes de reter a luz, propiciando o surgimento e aprimoramento das técnicas que fundamentam a linguagem fotográfica. Como marco cronológico, mesmo sendo um processo, ela nasce em 1826, quando o francês Joseph Nicéphore Niépce (1765-1833) criou o processo de "heliografia", ou seja, uma “gravura a partir da luz do sol”. Somente em 1837, o também francês Louis Jacques Mandé Daguerre (1787-1851) criou um processo de retenção da luz em uma câmara escura com uma placa com componentes químicos sensíveis à luz. A vantagem do Daguerreótipo era a sua economia de tempo e facilitação do processo. 

Sala de exibição do cinematógrafo
O Cinema segue a linha de desenvolvimento da Fotografia, dependendo de uma evolução tecnológica que propicia a captação e reprodução de imagens em uma dada sequência criando a ilusão de movimento. Para efeito de marco cronológico, o Cinema nasce em 1895 com a invenção do cinematógrafo dos irmãos franceses Auguste Marie Louis Nicholas Lumière (1862-1954) e Louis Jean Lumière (1864-1948). A diferença inicial do Cinema para a Fotografia era que, agora, a imagem não era mais estática, com a projeção em sequência de fotogramas, separados por uma pequena faixa preta, cria-se a ilusão de movimento, surgindo um efeito de realidade, pois, além de reproduzir o real de forma efetiva, o Cinema deu movimento para a reprodução. 

Sebastião Salgado
No universo da Fotografia, o brasileiro Sebastião Salgado é uma referência, sendo considerado um dos maiores de todos os tempos ao lado de nomes como Robert Capa (1913-1954), Henry Cartier Bresson (1908-2004), Robert Doisneau (1912-1994), etc. Sebastião Salgado passou a se dedicar a fotografia na década de 1970. Seus projetos fotográficos são conhecidos por retratar a figura humana em uma situação social adversa em meio à pobreza, à miséria e ao caos econômico, político e humanitário como visto nos seus livros de fotografias “Outras Américas” (1986), ou ainda em "Trabalhadores rurais" (1992). Em 2000, lançou a sua mais aclamada obra “Êxodo” e em 2013 foi lançado o seu projeto mais singular “Gênesis”, mostrando o homem e o Planeta Terra no seu estado inicial de harmonia e beleza. 

Wim Wenders e Sebastião Salgado
O filme “O Sal da Terra” é um documentário que mostra a vida e a carreira de Sebastião Salgado: da sua infância no interior de Minas Gerais, passando por sua estadia em Vitória, Espírito Santo, no início da fase adulta, até o seu exílio em Paris, na década de 1970, onde desenvolveu a sua aptidão e habilidades iniciais para a fotografia, finalizando no século XXI, com toda aclamação e reconhecimento por parte da crítica e do público. O filme é co-dirigido por Wim Wenders, um dos maiores e mais importantes cineastas vivos, que além de admirador da obra de Sebastião Salgado, também dá o seu depoimento sobre o fotógrafo brasileiro. O documentário centra-se na figura do homem, do fotógrafo que com a sua sensibilidade com “câmera olho” percorreu o planeta retratando, de forma poética e artística, o homem com fotos tiradas ao longo de mais de trinta anos de carreira. 

Juliano Ribeiro Salgado,
Sebastião Salgado e Wim Wenders
Wim Wenders cria uma narrativa para o material captado e pré-selecionado por parte de Juliano Ribeiro Salgado, que acompanhou o seu pai nas expedições fotográficas mais recentes. A escolha do cineasta alemão é sobrepor o artista com a sua obra, sobrepondo, assim, criador e criatura. Algumas fotos de Sebastião Salgado são analisadas com comentários nos quais o fotógrafo olha para a fotografia, criando um efeito de “marca d’água”, tentando recordar o contexto, a proposta, etc. A formação de Sebastião Salgado na área de economia é destacada, pois seria ela a base da sua visão crítica sobre a sociedade e a relação do homem com o universo do trabalho, bem como a compreensão das dinâmicas sociais, que são a base dos seus projetos artísticos. 

Cena de "Asas do desejo"
Poucos cineastas conseguem criar um diálogo interessante com a fotografia, conseguindo “desenhar com a luz”, como é o caso de Wim Wenders. Seus filmes possuem belas fotografias, como “Paris, Texas” (1984) e, uma das obras máximas do Cinema, “Asas do desejo” (“Der Himmel über Berlin”, 1987). Assim, o cineasta alemão faz um diálogo entre Fotografia e Cinema de forma perfeita. Da união no documentário “O Sal da Terra” entre Sebastião Salgado e Wim Wenders tem-se que, filosoficamente e artisticamente, a fotografia retém o real em uma fração de tempo, já o cinema dá movimento para o tempo retido. Portanto, na busca do tempo perdido ou da passante do poema de Charles Baudelaire, a imagem desenhada pela luz eterniza o efêmero.

Trailer do filme "O Sal da Terra"

O Multiculturalismo e o Cinema Francês

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Diz-se que o pensamento e a cultura francesa são cartesianos, ou seja, possuem o racionalismo como base e a busca de modelos e estruturas como método. Os franceses legaram à sociedade ocidental as bases do pensamento moderno principalmente a partir do Iluminismo no século XVIII com a tentativa de “iluminar a humanidade através da razão”, culminando em um ápice com o Estruturalismo Francês no século XX. No entanto, o pensamento extremamente racional e estruturalista da sociedade tradicional francesa ainda se choca com sistemas complexos, como é o caso da questão da imigração e do multiculturalismo devido à globalização e à dinâmica de migração do final do século XX e início do XXI.

O filme “Que mal eu fiz a Deus” (“Qu'est-ce qu'on a fait au Bon Dieu?”, França, 2014) consegue de uma maneira simples, lúdica, e até mesmo cômica, representar as dificuldades da sociedade tradicional francesa de se adaptar e se relacionar de forma multicultural com outras etnias e culturas. Na produção, Claude e Marie Verneuil são um casal tradicional francês de classe média alta que têm quatro filhas. As três primeiras se casaram com indivíduos que representam um grupo étnico da sociedade francesa: Isabelle se casa com o muçulmano Rachid que é um advogado de origem argelina; Odile se casa com David, um judeu que tenta prosperar com o comércio; e Ségolène se casa com Chao, de origem chinesa.

Como gaullista e estereótipo do francês padrão, Claude e sua esposa ainda possuem a esperança de que a sua última filha solteira, Laure, se case com um homem “típico francês”. Contudo, ela se apaixona e mantém um relacionamento de mais de um ano com Charles, um afrodescendente da Costa do Marfim que estuda teatro na capital francesa. Inicialmente, Laure diz que vai se casar e declara apenas, com receio da reação dos pais, que o noivo é, para a alegria da mãe, católico apostólico romano. Charles também encontra dificuldades para que a sua família aceite o casamento, de modo que seu pai não aceita que seu único filho homem se case com uma francesa caucasiana. Assim, a questão da aceitação é colocada de ambos os lados.

O restante do filme é os preparativos para o casamento de Laure com Charles e a tentativa do pai da noiva e do noivo de sabotarem a cerimônia do matrimônio. O interessante, é que, em paralelo, há a construção da harmonia e amizade entre os genros. O muçulmano Rachid se torna amigo do judeu David (algo que no plano geopolítico é difícil de acontecer) que se tornam amigos do chinês Chao. O três personagens são importantes, pois representam parcelas da sociedade francesa atual e todos eles se adaptam à cultura e fundem não só seus genes com os franceses, mas também a sua cultural com os demais. Chao ajuda David a ganhar um financiamento para a sua linha de comida saudável para muçulmanos, que tem a aceitação de Rachid.

O diálogo, aceitação e fusão da sociedade e da cultura francesa com as culturas dos imigrantes está em processo. Inicialmente, houve um estado de estranhamento e distanciamento, depois inicia-se a aceitação, em seguida a troca e, por último, o estágio de fusão. O processo inicial é evidente em acontecimentos que ficaram conhecidos como “Revoltas dos banlieues (periferia)” nas quais jovens franceses descendentes de imigrantes se revoltavam contra a marginalidade que estavam legados na sociedade francesa. Filmes como “Entre os muros da escola”, ganhador da Palma de Ouro de Cannes em 2008, e “Samba”(2014) representam o difícil diálogo da cultura francesa com os imigrantes.

O Brasil, por exemplo, é um país multicultural com influências, e mesmo base, de três culturas: a indígena, a europeia e a africana. A primeira vez que houve a aceitação e a utilização da três de forma equânime foi na Arte Modernista entorno da Geração Modernista de 22 com a figura do escritor Oswald de Andrade (1890-1954) e do Manifesto Antropofágico (1928). Na Alemanha, o cineasta Fatih Akin (1973-) consegue fazer a fusão da cultura alemã e turca nos seus filmes como “Contra a parede” (2005) e “Do outro lado” (2007). No caso francês, o diretor Philippe de Chauveron (1965-) também conseguiu unir a sociedade francesa no filme “Que mal eu fiz a Deus”, fazendo com que cada nova parcela dela se case com uma das filhas do personagem Claude.

Por fim, o que há na sociedade francesa é um duplo movimento: um de ressalva para a preservação de uma identidade e uma história cultural; e o outro de alteridade, da relação com o outro, com a diferença como parte integrante de um movimento natural e irreversível. Na busca pelo perene, pelo imutável, por modelos e estruturas que durem para sempre, anda-se em círculos, pois há o efêmero, a entropia. Os modelos estruturalistas não conseguem domar o caos e, nas novas organizações, advindas de fusões, renascimentos, gira o comboio de corda a entreter a razão, como declamaria o poeta português Fernando Pessoa. O filme “Que mal eu fiz a Deus” é apenas um entretenimento à razão, uma luz do Cinema.

Trailer do filme “Que mal eu fiz a Deus”



O Cinema Indie com “Frank”

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Uma das perguntas mais difíceis que se pode colocar para alguém é quem ele é. Na maioria das vezes, a resposta surge a partir do verbo “ser” acompanhado da profissão: “sou médico”, “sou professor”, “sou físico”, etc. Assim, o ser é caracterizado pela profissão. No caso da personagem Frank, do filme homônimo inglês dirigido por Lenny Abrahamson, lançado em 2014, ele é músico, mas não um qualquer, faz parte de uma banda excêntrica e usa sempre uma cabeça gigante artificial. Sendo músico, é um artista que possui sensibilidade, loucura e criatividade, fazendo com que não se encaixe nos padrões sociais vigentes, com condutas diagnosticadas como loucas, insanas e anti-sociais.

O filme “Frank” não se incia com a personagem homônima principal, mas, sim, com Jon, um músico com um emprego fixo e burocrático em uma empresa. Ele tenta ter inspirações com coisas do cotidiano para compor músicas: uma criança construindo castelos de areia na praia, uma mulher com um bebê, uma moça com um casaco vermelho, outra com um azul, ou ainda o cartaz de uma banda que tocará na cidade, tudo pode se transforma em versos de uma canção. Em sua casa, tenta criar uma melodia com os versos, usando apenas três acordes. Utiliza um programa de computador e o seu teclado para compor, sem êxito. No twitter (@jonburroughs), escreve para quatorze seguidores: “trabalhando duro o dia todo em uma canção, agora, jantar”.

Jon tem a sua rotina quebrada quando presencia um homem tentando se afogar, na verdade o tecladista chamado Lucas da banda de Frank, conhecida como “The Soronprfbs”. A banda precisa de um novo tecladista, Jon se prontifica para assumir o posto. Ao chegar na apresentação, nota que a banda não é convencional, a começar pelos instrumentistas: Clara no Teremim, Nana na bateria, Baraque na guitarra e Frank nos vocais. A banda é inusitada não apenas pela cabeça gigante e artificial de seu vocalista e líder, mas também pelos músicos, que não tocam uma música tonal, em harmonia, em um único ritmo; mas, sim, uma música serial com cada instrumento em um tom. Jon é o novato, tenta improvisar, achar a nota certa.

O restante do filme é os músicos em uma casa à beira de um lago no interior da Irlanda. Querem compor um disco, o isolamento social e a união entre eles é a base, como ocorreu com os Rolling Stones, New Order e Happy Mondays. No entanto, Jon relata a rotina da banda no Twitter, saindo de quatorze para 25.790 seguidores, ou com vídeos no youtube. Os vídeos da excêntrica banda se tornam virais na rede. Recebem o convite para tocar no famoso festival de música Indie chamado SXSW na cidade de Austin, no Texas. Os músicos agem como deslocados, avessos ao sucesso, com exceção de Jon, que quer se tornar um músico famoso. No entanto, a banda é um catalizador social, um elemento agregador, não possui qualidades musicais para a indústria musical.

O filme “Frank” faz parte da linha de produções independentes (indie), conhecidas como “cinema indie”, com produções de baixo orçamento que trabalham a narrativa tendo personagens “deslocados” socialmente, caracterizados por patologia/esquisitices como acontece em filmes como “Pequena Miss sunshine” (EUA, 2006), dirigido pelo casal Jonathan Dayton e Valerie Faris; “O Futuro” (EUA, 2013) de Miranda July; ou ainda “Tudo Acontece em Nova York” (EUA, 2012) dos diretores Ruben Amar e Lola Bessis. São, na maioria das vezes, personagens problemáticos do ponto de vista social, que não se encaixam ou tem dificuldades de se enquadrarem em uma classe social ou mesmo de agir segundo o padrão social de comportamento ditado.

O interessante que este tipo de roteiro acaba fundindo dois gêneros difíceis de serem conciliados: a comédia e o drama. Pelo fato de possuir personagens deslocados socialmente, pode-se provocar situações inusitadas, devido à inaptidão nas relações sociais ordinárias, cotidianas, o que gera elementos de humor, como a situação de Frank que acaba tendo problemas por não conseguir fazer coisas banais como escovar os dentes. No riso, há o distanciamento, pois o espectador não se identifica com a personagem e, por isso, ri dela. Mas, logo em seguida, tem-se a causa do porque Frank usa a cabeça, criando também pontos dramáticos, o que cria uma empatia, ou seja, uma aproximação da personagem com o espectador, criando, deste modo, as bases do drama.

Na história da música pop há exemplos de músicos que não conseguiram lidar com a fama ou com determinados comportamentos sociais, como é o caso de Jim Morrison, Syd Barrett, Brian Wilson, Arnaldo Baptista, Ian Curtis e Kurt Cobain. Frank segue esta linha, sendo uma síntese de todos estes. No filme, o remédio de Frank é compor para ser a sua cura da sociedade doente. A música é a sua melhor amiga (como declama Jim Morrison) responsável pela união entre seus pares, iguais: loucos na sua balada. No fim, Jon percebe que não seria possível fazer os músicos da banda “The Soronprfbs” se adaptarem a uma sociedade doente, que o diga Syd Barrett: “Shine on, you crazy diamond/You were caught in the crossfire/Of childhood and stardom”.

Trailer do filme



Pier Paolo “Pasolini”

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Pier Paolo Pasolini é um dos maiores gênios do séculos XX. Nasceu em Bolonha, Itália, em 1922, e morreu na cidade costeira, próxima a Roma, de Óstia em 1975. Sua atuação intelectual e artística encontra eco e importância dentro da poesia, do teatro, do romance, de ensaios de cunho literário, filosófico e político; e, principalmente, dentro do Cinema, com filmes como “Accattone-Desajuste Social” (1961), “Gaviões e Passarinhos” (1966), “Teorema” (1968), e o mais conhecido e impactante: “Saló ou 120 dias de Sodoma” (1975). Em 2014, o cineasta estadunidense Abel Ferrara (1951-) realizou a produção “Pasolini” sobre as últimas horas da vida de Pier Paolo até o seu brutal e misterioso assassinato no dia 02 de novembro de 1975. 

Em “Pasolini”, o diretor Abel Ferrara escolheu o ator estadunidense Willem Dafoe para dar forma à personagem de Pier Paolo. O filme se incia com uma entrevista de Pasolini em francês comentando o lançamento do filme “Saló ou 120 dias de Sodoma”, há a mescla de imagens da produção de 1975 com questões de cunho político, cinematográfico e relacionadas à estética, a frase “Quem se recusa a se escandalizar é um moralista” é colocada como resposta. Já em Roma, a rotina do último dia de Pasolini é mostrada: a vida particular na relação com a sua mãe, com amigos, com um jornalista que o entrevista. Seu processo criativo é mostrado, seja escrevendo roteiros ou narrativas em sua máquina de escrever ou no diálogo com entes queridos. 

Mas, é noite, na sua última noite, Pier Paolo vai ao seu restaurante favorito e, por fim, decidi ir à região do meretrício romana em busca de um “ragazzo di vita” (garoto de programa). Pasolini era homossexual e gostava de se relacionar de forma perigosa e autodestrutiva com garotos de programa. Após escolher um, decidi ir à cidade de Óstia. Ao ter relações sexuais na praia, é atacado por um grupo de rapazes que o espancam e, consequentemente, o matam de forma brutal. Durante anos, o assassinato de Pier Paolo foi uma incógnita, alguns proclamavam que foi político, pois ele era um grande crítico de valores de grande parcela da sociedade italiana, outros acreditavam em crime homofóbico, mesma versão mostrada por Abel Ferrara. 

O filme de Abel Ferrara é simples, intimista. Tem-se recorrentemente planos cinematográficos fechados, centrados em Pasolini mostrando o seu cotidiano como filho, escritor e cineasta com o seu processo criativo e as suas obrigações como artista. Há a fusão de imagens da produção “Saló”. Algumas partes o trabalho de escrita de Pier Paolo ganha forma no filme de Ferrara em uma interessante relação sobre imagem e palavra no qual há uma narrativa que também dá corpo a uma narrativa literária com a história de um pai com o seu filho que vão, em pleno século XX, atrás da estrela de Belém que estaria anunciando a chegada do messias. Assim, há a narrativa biográfica como também a adaptação de uma narrativa literária escrita por Pasolini. 

"Gaviões e Passarinhos"
Pier Paolo Pasolini é conhecido por fazer um “Cinema político” com críticas e ataques às instituições sociais, representadas pelos poderes econômicos, políticos e religiosos. Sua luta foi contra o conservadorismo e a moral burguesa italiana. A postura marxista de Pasolini foi além da sua filiação ao Partido Comunista Italiano, está presente nos seu filme “Teorema” que ataca a ideologia, a futilidade e a alienação burguesa. No filme “Gaviões e passarinhos”, o cineasta filma com o comediante italiano Totò (1898-1967) uma fábula alegórica da luta de classes, na qual um corvo marxista acompanha um pai e um filho em uma estrada, apresentando de forma simplificada conceitos relacionados à análise e crítica da sociedade burguesa. 

"Saló ou 120 dias de Sodoma"
Pier Paolo Pasolini utiliza-se da alegoria no seu filme mais conhecido e polêmico: “Saló”. A história se passam em 1944 na Itália onde um grupo de quatro senhores, cada um representando uma parcela do poder da sociedade italiana: um presidente de um banco, que representa o poder econômico; um bispo, representando a igreja; um duque, que representa a nobreza e um juiz, que representa o poder judiciário. Eles selecionam um grupo de jovens para serem objetos de tortura e sadismo durantes cento e vinte dias. O filme é dividido em três partes, chamadas de “círculo”: “Círculo das manias” com a satisfação dos desejos sexuais; “Círculo das fezes” com cenas de escatologia, e o “Círculo de sangue” centrado em punições e castigos sádicos. 

Pier Paolo Pasolini
Pasolini é uma figura controversa, amado por uns, odiado e repugnado por outros. Enquanto artista, é um dos mais importantes do século XX, sendo um dos grandes cineastas do seu tempo com filmes importantes para a história do cinema, com os quais o seu nome é propagado para além da cultura italiana influenciando cineastas como Bernardo Bertolucci, Julio Bressane e Abel Ferrara, que dirigiu, prestando homenagens, o filme “Pasolini”, retratando a vida, a morte do homem, do artista. A proposta estética e política de Pier Paolo Pasolini era escandalizar para atacar a moral, utilizando o corpo, a nudez, o sexo, demonstrando o grotesco como forma de denúncia e reflexão. No seu cinema, do desgosto, do mal-estar, surgem a reflexão.



Trailer do filme "Pasolini"