Mídia Alternativa e Audiovisual

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O número 62 da revista RUA (Revista Universitária do Audiovisual) traz uma edição dedicada à discussão das Mídias Alternativas dentro do Audiovisual e o seu impacto social nas últimas manifestações ocorridas no Brasil no último mês de junho. A revista está ligada ao curso de Imagem e Som da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) e é uma das mais importantes do gênero no interior do Estado de São Paulo. Para se entender as movimentações, os movimentos e a organização das últimas e constantes manifestações sociais, é indispensável entender como se dá e qual a importância da Mídia Independente e Colaborativa, opondo-a à mídia tradicional, bem como quais são as suas principais características e conceitos. 

A mídia tradicional, até há pouco tempo, possuía o poder hegemônico dos canais de comunicação (televisão, jornais, rádios, etc) e, com isso, detinham o poder de controlar as informações. No entanto, o papel social da mídia tradicional sempre foi limitado e restrito, seja pela sua relação com os poderes institucionais, ou com conglomerados políticos, financeiros, etc., o que a coloca como arauto de ideologias específicas, sendo impositiva de certa postura social. No Brasil, os meios de comunicação, predominantemente, pertencem à políticos, famílias, e conglomerados, de modo que, em muitos casos, as informações veiculadas atendem a uma política editorial ideologicamente orientada e informativamente submissa, direta ou indiretamente, aos poderes políticos municipais, estaduais ou nacionais. 

Em contra partida à mídia tradicional, as Mídias Alternativas sempre se colocaram e produziram material de forma independente, autônoma e colaborativa, com uma proposta de democratização dos meios de comunicação. Mídias Alternativas sempre existiram, seja através de rádios comunitárias (“ou mesmo piratas”), fanzines, jornais livres e de classe. Porém, com o advento da internet e, principalmente, de plataformas digitais, e de redes sociais, a Mídia Alternativa ganhou força e, hoje, consegue rivalizar e, até mesmo, superar a mídia tradicional, quebrando o monopólio da informação. 

A Mídia Independente atual é colaborativa, ou seja, ela não é hierárquica, institucional e vertical; mas, sim, livre, autônoma e horizontal. Ela se constitui como uma rede, no qual o canal pode ser o youtube ou o Postv, onde com o aplicativo Twitcasting pode-se transmitir online via celular ou tablet qualquer informação em tempo real. Podemos caracterizá-la como polifônica, similar ao que ocorre na Música ou na Literatura de Dostoievski, possuindo diversas vozes, diversos agentes criadores da informação. Um exemplo de criação colaborativa ocorreu nas manifestações do último dia 22 de julho na cidade do Rio de Janeiro, onde as informações geradas pelos diversos NINJA’s, ou pelos manifestantes de forma direta, contradisseram as informações que foram vinculadas pela mídia tradicional, aliada ao governo do Estado. Assim, a informação propagada ideologicamente pela mídia tradicional foi questionada pelas diversas visões e dezenas de imagens e vídeos compartilhados pelos manifestantes em tempo real e sem cortes via facebook e twitter. 

A mídia NINJA (Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação) é um coletivo de indivíduos que pregam a ação jornalística contra o monopólio da informação da mídia tradicional, sendo um grupo livre, autônomo, independente e colaborativo, ou seja, qualquer indivíduo pode colaborar com a socialização da informação, utilizando recursos simples como celulares e tablets, compartilhando as informações criadas. A Mídia Independente e Colaborativa tem um papel social enorme, não só por democratizar a produção, os canais e a própria informação, mas, também, por cumprir um papel de transformação social, já que auxilia diretamente os movimentos sociais que lutam contra as contradições do sistema capitalista e contra a opressão, violência e vandalismo do Estado. 

Os vídeos produzidos de forma colaborativa utilizam aplicativos e são colocados em plataformas de vídeos sendo compartilhados via facebbok e twitter, possuindo uma sintaxe com certas características recorrentes, tais como: o caráter direto, as imagens são geradas de dentro do espaço da ação e do núcleo de criação da informação, sendo transmitidas ao vivo, sem cortes e sem censura. Elas são produzidas por diversos olhares, o que multiplica os pontos de vista sobre os objetos. As imagens não possuem qualidade, não havendo enquadramentos recorrentes e padronizados, pois, a movimentação e o aspecto dinâmico criam, também, uma imagem livre e dinâmica. 

O que se tem, na atualidade, é uma crise da mídia tradicional e o advento da Mídia Alternativa e Colaborativa. A informação, agora, cumpre uma função social de denúncia contra os sistemas de contradições sociais e o vandalismo do Estado, como também de organização e de mobilização da população. O cineasta francês Jean-Luc Godard, na década de 1960, exaltava as possibilidades revolucionárias do Vídeo, que criou uma revolução dentro do Audiovisual, mudando o eixo de influência Cinema-outros meios para Vídeo-Cinema e para a sociedade. Agora, têm-se as Mídias Alternativas com uma nova sintaxe e uma nova organização do discurso jornalístico pautado no audiovisual, centrado na imagem, influenciando não só o campo do audiovisual e jornalístico, mas, também, o sociológico, pois novas formas de relações e organizações são possíveis. Portanto, a revolução pode não ser televisionada, mas será, sim, compartilhada.

Comemorações de 13 de julho

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Toda linguagem artística possui uma forma e um conteúdo, sendo o conteúdo expressão da forma. No caso da Música, tratada como uma linguagem, ou um sistema semiótico, há o som e o sentido. Quando no dia 13 de julho comemoramos o Dia Internacional do Rock, estamos saudando o gênero musical mais expressivo da Música Serial Pop surgida na segunda metade do século passado. Enquanto gênero, ele possui uma multiplicidade de formas e de conteúdos, que se subdividem em outros subgêneros: o Progressivo, Punk, Ska, Indie, Tecnopop, Pop, New Wave, Folk Rock, Britpop, Black Metal, Heavy Metal, Grunge, em um constante eterno retorno de formas simples para formas complexas e vice-versa. 

O estudo da Música a partir de um viés semiótico está presente no campo de estudos chamado “semiótica da canção”, no Brasil, desenvolvido por Luiz Tatit e José Miguel Wisnik. Segundo Wisnik, a história da música pode ser compreendida a partir de três estágios e/ou grupos: a música modal, a música tonal e a música serial. A primeira é baseada em modos e não em torno de uma nota principal. A segunda surge quando o sistema tonal é adotado, baseando-se em estruturas funcionais determinadas, gerando um "percurso" harmônico e melódico com tensões e repousos mais complexos. A terceira é a música serial surgida com a dodecafonia e a reincorporação do ruído à música e, no caso da música pop, da sua eletrificação, amplificação e da escala pentatônica. 

No início, o Rock era Rock'n'roll, uma síntese de duas linhas evolutivas da música popular estadunidense: a Rhythm and Blues com Country and Western, pode-se dizer que ele possuía 80% do primeiro e 20% do segundo (em relação a seu primo próximo, o Rockabilly, essa proporção é de 50% por 50%). Tinha, no máximo, doze compassos, com três ou quatro notas da escala pentatônica a partir de uma forma simples que não passava de três minutos. O conteúdo era simples e retratava o cotidiano da vida adolescente urbana, com temas relacionados ao amor, às relações familiares, e ao cotidiano escolar, sendo apenas um produto para ser consumido pelo público adolescente. O surgimento do Rock enquanto gênero possui três responsáveis: Bob Dylan, The Beatles e The Velvet Underground. 

O parricídio ocorre em 1965, quando o Rock nasce enquanto gênero e se desgarrar das formas simples e limitantes do Rock'n'roll. No dia 24 de julho, Bob Dylan liberta o gênero de suas amarras formais, a forma é expandida; o Bardo lança a música Like a Rolling Stones. A canção não estaria mais presa a uma forma fixa, pequena e limitada, seus limites formais foram ampliados para além dos três minutos padrões. Like a Rolling Stone inicia um processo cíclico de desenvolvimento formal da música pop serial, com o desenvolvimento da forma musical, foi-se do Progressivo, com músicas que ocupam dois lados inteiros do disco como, por exemplo, Thick as a Brick (1972) da banda inglesa Jethro Tull; para a volta de formas simples com o Punk, através de músicas como Blitzkrieg bop e I wanna be sedated (1975), dos Ramones. 

No dia 06 de agosto de 1965, os Beatles lançam o disco Help, o conteúdo se torna mais complexo e amplo. As músicas não possuíam mais temática unicamente adolescente (Teen), ela agora dialoga com outros gêneros, como a música Modal Hindu, a Erudita, etc. Com o disco Help, os Beatles iniciam uma segunda fase em sua carreira e modifica a música pop serial. Com a música Yesterday, a configuração básica e recorrente de banda de rock'n'roll é modificada: a canção, composta por Paul McCartney, é executada, não por uma guitarra, um baixo e uma bateria; mas, sim, por um quarteto de cordas composto por dois violinos, uma viola e um violoncelo, sendo esta uma formação padrão típica da Música de Câmara Tonal Erudita. 

A banda estadunidense The Velvet Underground é, ao lado dos Beatles e de Bob Dylan, uma das principais responsáveis pela consolidação do Rock enquanto gênero com um conteúdo pretensamente elevado e artístico. A banda foi formada em 1965 por Lou Reed (vocal e guitarra), John Cale (guitarra e piano), Sterling Morrison (contrabaixo e guitarra) e Maureen Tucker (bateria), e logo foi "apadrinhada" pelo Artista-vanguardista Andy Warhol, que incorporou aos vocais da banda, em 1966, a atriz alemã Nico (Christa Päffgen), que havia participado do filme “A Doce Vida” ( La Dolce Vita, Itália, 1960) do cineasta italiano Federico Fellini. 

Se temos, hoje, o que comemorar no dia 13 de julho, saudemos os que primeiros trouxeram as boas novas: Bob Dylan, The Beatles e The Velvet Underground. Quem tiver ouvidos, ouçam. Mas, no compasso máximo, na forma cíclica; na ontogênese e na partenogênese do desenvolvimento da Música Serial Pop em um eterno retorno das formas simples para as complexas. As proles são muitas: há bastardos, filhos pródigos; harmonias complexas, simples; escalas pentatônicas, diatônicas; simultaneidades: modal, tonal, serial.